Toma contínua da pílula: sim ou não?

Toma contínua da pílula: sim ou não?

Os riscos, vantagens e cuidados a ter na toma contínua da pílula ou de outros contracetivos hormonais.

  • PorManuela VasconcelosJornalista

  • ColaboraçãoDr. Alexandre LourençoConsultor em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital de Santa Maria
  • Dra. Tereza PaulaConsultora em Ginecologia e Obstetrícia na Maternidade Dr. Alfredo da Costa 

A pílula foi o motor da emancipação feminina e contribuiu de forma decisiva para a forma como as mulheres gerem o seu destino. Assim, após a liberdade de conceção chega, agora, uma nova tendência: o desejo de libertação da menstruação, uma vontade que leva mulheres de todas as idades a tomar contracetivos hormonais sem interrupção. A toma contínua da pílula é uma opção procurada por mulheres que têm dores menstruais fortes, tensão pré-menstrual (TPM) ou que pretendem suspender a menstruação por questões de conforto ou, por exemplo, devido à prática desportiva.

Ao fim de um ano, uma mulher que faz a pausa de uma semana na toma da pílula tem menos de 25 por cento de etinilestradiol (uma hormona sintética) no organismo do que uma mulher que faz a sua toma contínua

«Muitas atletas de alta competição fazem a toma contínua da pílula para não menstruarem. Isto porque favorece o treino, têm valores de hemoglobina mais elevados, aguentam melhor o esforço e têm melhor rendimento desportivo», diz Alexandre Lourenço, consultor em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital de Santa Maria que, em conjunto com Tereza Paula, consultora em Ginecologia e Obstetrícia na Maternidade Dr. Alfredo da Costa, esclarecem, em entrevista à Revista Prevenir o que não pode deixar de saber.

Que métodos contracetivos permitem interromper a menstruação?

Os métodos contracetivos que permitem interromper a menstruação são os métodos hormonais. A toma contínua pode, como refere Tereza Paula, médica ginecologista, «ser feita com qualquer forma de contraceção hormonal, seja em forma de pílula, anel ou adesivo». Na opinião de Alexandre Lourenço, «se o objetivo for interromper a menstruação, durante três meses, pode tomar uma pílula continuamente; se quiser não menstruar durante dois ou três anos, quer o dispositivo (com hormonas, o SIU) quer o implante podem ser mais adequados. Deve ser feita uma avaliação da mulher e dos riscos para perceber qual é a melhor opção.»

Existe uma pílula específica para este fim?

Nos Estados Unidos da América existe já uma pílula para este efeito, enquanto em Portugal se recorre à toma sucessiva da pílula de 21 dias. Segundo Alexandre Lourenço, «só as monofásicas devem ser usadas para este fim, pois a dose deve ser sempre igual. Caso contrário, alguns comprimidos podem não ter estrogénio ou progesterona e isso pode levar a menstruar. A pessoa pensa que está a fazer a toma contínua da pílula mas não está.»

Qualquer mulher pode fazer a toma da pílula contínua?

«As indicações e contraindicações da toma da pílula mantêm-se, ou seja, as mulheres que não podem tomar a pílula com pausa também não o podem fazer de forma contínua», defende Tereza Paula. Alexandre Lourenço acrescenta que «as mulheres que têm doença familiar relacionada com a coagulação, doenças como asma ou diabetes ou tensão alta não devem fazer a toma contínua com contracetivo oral combinado. Além disso, os extremos de peso – mulheres obesas ou muito magras – não toleram a toma contínua. Isto porque os estrogénios estão acumulados na gordura e quem tem muito peso tem estrogénios a mais, e vice-versa. O desequilíbrio entre o estrogénio e progesterona interfere na menstruação.»

Em que casos  a toma contínua da pílula é recomendada por razões médicas?

«Quando a menstruação é muito dolorosa ou quando existem patologias que surgem apenas nessa altura, como as enxaquecas», explica Tereza Paula.

Não fazer uma pausa na pílula e não ter menstruação envolve riscos para a saúde?

Segundo Tereza Paula, «não há evidência médica e científica que nos diga que temos de fazer o intervalo de sete dias na toma da pílula. Esta pausa existe para mimetizar o ciclo menstrual e para as mulheres saberem se estão grávidas. Do ponto de vista médico não há necessidade de pausa, que só existe por questões culturais. As mulheres que tomam a pílula não têm menstruação, mas sim uma hemorragia de privação que só acontece porque há uma pausa na toma.»


Uma opinião partilhada por Alexandre Lourenço: «É uma questão social e não clínica. Uma coisa é não menstruar devido a uma doença (como patologia no ovário, ou hipófise), outra coisa é porque se está a tomar um medicamento para esse efeito». Em situações de toma contínua, «o que sabemos dos estudos é que, com algumas pílulas, após dois a três meses de toma contínua a mulher começa a perder sangue. Não é uma menstruação, são perdas de sangue», esclarece o médico.

Porque ocorrem estas perdas de sangue?

«O endométrio é composto por glândulas que crescem e diminuem sob a ação de estrogénio e progesterona. Há alturas em que crescem demais ou atrofiam e descamam e sangram. Esta situação não tem impacto na saúde, mas na qualidade de vida das mulheres, porque em vez de estar três dias com uma menstruação normal pode estar dez dias com pequenas perdas imprevisíveis.»

A menstruação pode alertar para problemas de saúde ou gravidez. o que acontece quando se deixa de ter este barómetro da saúde?

«A toma contínua da pílula não encobre nada. Se a mulher tiver algum problema que provoque hemorragia, por exemplo, também o terá com a toma contínua da pílula. O mesmo se passa no caso de gravidez, por falhas na toma, terá outros sinais que indicarão essa situação, como a tensão mamária», explica Tereza Paula. Uma consequência direta da falta de menstruação é, na opinião de Alexandre Lourenço, a «ausência de anemia. As mulheres que não menstruam têm menos anemia e isso é positivo».

«Sendo uma toma que implica uma dose hormonal mais elevada no final, não é aconselhada a grandes fumadoras nem a mulheres com mais de 40 anos»

Não fazer pausa na toma da pílula significa ter um consumo excessivo de hormonas?

«Fala-se de pílulas combinadas de baixa dosagem ou em reduzir a dosagem devido ao etinilestradiol que a pílula contém. É um estradiol sintético muito potente que se associa à trombose venosa e a eventuais embolias nas veias», refere Alexandre Lourenço, explicando que «quando a mulher faz a pausa de uma semana, ao fim de um ano, tem menos 25 por cento de etinilestradiol no organismo. Por esse motivo, no caso das mulheres que têm risco de doença associada à toma da pílula, o uso continuado é mais arriscado do que a toma convencional. Sendo uma toma que implica uma dose hormonal mais elevada, não é aconselhada a grandes fumadoras nem a mulheres com mais de 40 anos».

Qual é a alternativa?

Optar por uma pílula combinada que não contenha este componente (existem duas no mercado) ou por uma pílula apenas com progesterona. «As trombofilias, doenças da coagulação, do fígado, normalmente aumentam o risco de trombose venosa. Há famílias que têm essa doença ou hemofilias que contribuem para que isso possa ser mais frequente. São casos que não deveriam tomar nenhuma pílula com etinilestradiol», alerta Alexandre Lourenço.

A toma contínua da pílula pode afetar a fertilidade?

Segundo os especialistas, não. Quem pretende engravidar, deve suspender a toma e cumprir um período de espera. O ideal sugere o médico, é «ter duas menstruações normais e depois tentar engravidar», para perceber quando ocorrem as menstruações, sem a influência da pílula, e porque nesses dois meses a probabilidade de ter gémeos é superior.

Durante quanto tempo podemos tomar a pílula sem interrupção?

Segundo Tereza Paula, «não há problema em fazer a toma contínua. O que pode acontecer, a certa altura, é a mulher ter perdas de sangue quando não está à espera». Já Alexandre Lourenço, aconselha a «tomar a pílula durante três meses, interromper uma semana, retomar e assim sucessivamente. Acaba por ser uma toma contínua praticamente, a mulher menstrua três a quatro vezes por ano, nas alturas em que entender, em vez de estar sujeita a perdas de sangue que geralmente ocorrem e são imprevisíveis.»


Toma contínua da pílula: Vá ao médico…

  • Antes Seja para fazer toma contínua ou não, antes de iniciar a toma de uma pílula deve consultar o médico. Só ele poderá analisar os riscos e recomendar a melhor solução para si. «Há mais de 30 formulações. Temos de analisar caso a caso para escolher a mais indicada», comenta Alexandre Lourenço.
  • Durante Após alguns meses de toma contínua da pílula, podem surgir perdas de sangue. Se isso suceder entre em contacto com o seu médico para saber como agir. Alerte-o também sempre que detetar alterações ou sintomas como dores, enxaqueca, náuseas, dores nas pernas e problemas hemorrágicos. Na ausência de sintomas, faça anualmente a consulta de rotina.

Tipos de pílula

Pílulas combinadas

São as mais comuns e incluem estrogénios e progesterona. Podem ser monofásicas, cujo comprimido tem a mesma dosagem e implica 21 dias de toma e sete de pausa, ou multifásicas (bifásicas, trifásicas), em que a toma pode ter de 24 ou 28 dias e a dosagem difere ao longo do mês. Estas últimas incluem comprimidos placebo, sem efeito hormonal, evitando falhas na toma.

Pílulas sem estrogénios

Contêm apenas progesterona. A sua toma é, por regra, contínua e está associada a amenorreia (ausência de menstruação). São muito usadas, por exemplo, na fase de amamentação ou por quem tem contraindicações para a toma de pílula combinada, como as mulheres fumadoras acima dos 35 anos ou as hipertensas.

Fonte: Adaptado de dados fornecidos por Alexandre Lourenço e Tereza Paula, médicos ginecologistas

Última revisão: Julho 2014

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