Os efeitos da luz azul na nossa saúde

luz azul: quais os perigos?

A luz azul corresponde a 40 por cento da radiação solar que chega à Terra e é fundamental à nossa vida. Contudo, é também emitida, de forma artificial, por tablets e outros equipamentos, e os erros que cometemos quanto ao nível de exposição podem transformá-la num inimigo para a saúde.

  • PorRita AlvesJornalista

  • ColaboraçãoDra. Joana Dias CoelhoMédica dermatologista
  • Dr. Luís Gouveia de AndradeMédico oftalmologista 
  • Dr. Miguel Meira e CruzMédico dentista, especialista em Cronobiologia e Medicina do Sono, diretor clínico do Centro Europeu do Sono

«Através de viagens ao espaço e de fotografias recolhidas desde 1970, os astronautas têm verificado que o nível de poluição luminosa na Terra cresce a um ritmo assustador, mesmo nas regiões mais remotas», afirma Miguel Meira e Cruz, especialista em Cronobiologia e Medicina do Sono, fenómeno que considera tão interessante quanto perigoso, «pois determina alterações na fisiologia de espécies que ao longo de toda a sua existência se adaptaram aos fenómenos rítmicos da natureza, entre os quais o ciclo luz-escuridão condicionado pela noite e pelo dia». A luz azul é essencial à nossa existência: quando proveniente de uma fonte natural, o sol, permite-nos ver, regula os nossos sonos e mantém a pele mais bonita. Contudo, quando a exposição provém de fontes artificiais, como ecrãs de aparelhos tecnológicos, pode ameaçar a nossa saúde, atuando como fator de risco para várias doenças.

O que é a luz azul?

«A luz visível é designada de luz branca por conter uma combinação de diferentes radiações que formam a luz que diariamente vemos. Nas extremidades dessa combinação, estão os infravermelhos (que emitem calor, mas não são visíveis) e os ultravioletas (UV) – também invisíveis, mas sem calor –, dos quais a luz azul está mais próxima», refere Luís Gouveia Andrade, médico oftalmologista. Segundo Miguel Meira e Cruz, «a sua deteção ocorre por células fotorrecetoras na retina do olho (células ganglionares) que alteram o sinal luminoso, permitindo que chegue às células (núcleo supraquiasmático do hipotálamo) que constituem o relógio biológico central».

Onde está presente

«Naturalmente existente no meio ambiente, pelo sol, a presença de luz azul é mais intensa de manhã, motivo pelo qual o sol (pela luz que emana e pela escuridão quando está ausente) é o principal sincronizador do relógio biológico. Ao longo do dia, o espectro de cor vai variando, terminando no dos alaranjados e vermelhos antes de se “apagar” e, por isso, não teríamos acesso a luz azul tão forte noutros períodos que não o da manhã. Contudo, temos ecrãs de computadores, smartphones, smartwatches, tablets, televisão, luz LED branca dentro de escritórios, de casas e em muitos dos locais públicos e, assim, menos escuridão e muito mais luz azul», salienta Miguel Meira e Cruz, em entrevista à Revista Prevenir.

«O olho é muito eficaz no bloqueio das radiações UV e os óculos de sol reforçam esse efeito, mas a luz azul não é bloqueada»

«Embora a luz azul que provém do sol seja muitas vezes mais potente que a do ecrã de um computador, a nossa fisiologia circadiana acompanha o ritmo da luz solar, enquanto o computador nos expõe a luz azul em momentos em que já não lhe deveríamos ter acesso», explica. Segundo Luís Gouveia Andrade, «considerando o tempo que passamos em contacto com estes equipamentos, existe a preocupação legítima de saber se essa exposição pode ser nociva».

Como regula o nosso ritmo interno

«A luz que mais afeta o sistema de regulação circadiano, que envolve o sono, é a banda dos azuis, ao qual este sistema é mais sensível e responde mais intensamente, o que pode influenciar o momento em que o sono ocorre. Quando a luz chega ao nosso relógio biológico central, dá-se a inibição da produção de melatonina (hormona do sono), o que acontece naturalmente pela manhã, permitindo-nos despertar. A luz aumenta ainda a nossa atenção, produtividade e concentração. Por outro lado, de noite, com a escuridão, a produção de melatonina aumenta, indicando a hora de dormir. Este mecanismo degenera com a idade, resultando na diminuição do tempo de sono, que piora quando este sistema debilitado é sujeito a agressão da luz azul a horas tardias», alerta Miguel Meira e Cruz.

Por que pode prejudicar o sono

O impacto negativo da luz azul a nível do sono dá-se, principalmente, pela disrupção do ciclo sono-vigília, quando há uma exposição a fontes artificiais depois de escurecer: «A contaminação luminosa nas horas de escuridão determina um sono mais fragmentado e superficial, o que acontece, por exemplo, quando acendemos a luz durante a noite para ir à casa de banho. Estas alterações são mais graves quanto mais vulnerável for o sistema, como no caso de idosos (têm as defesas reduzidas) e crianças (têm lentes naturais significativamente mais transparentes e um sistema imaturo), podendo provocar ansiedade, insónia e problemas associados», explica Miguel Meira e Cruz, referindo ainda que «há estudos que demonstram uma associação entre a luz azul e alguns tipos de cancro, quer independentemente da sua ação no sono, quer pela influência na sua qualidade e diminuição».

Como atua nos olhos

«O olho é muito eficaz no bloqueio das radiações UV e os óculos de sol reforçam esse efeito, mas a luz azul não é bloqueada e, como tal, atinge a sua camada mais nobre: a retina. Sendo as suas células sensíveis à luz, existe o risco de desenvolver alterações semelhantes à degeneração macular, que pode causar perda permanente de visão. Além disso, a luz azul dispersa-se mais facilmente e, por isso, os equipamentos que a emitem apresentam menos contraste, podendo causar mais cansaço visual», explica Luís Gouveia Andrade.


«Contudo, não existem estudos conclusivos que atestem o efeito nocivo da luz azul nos olhos; grande parte das queixas dos utilizadores intensivos de equipamentos eletrónicos deve-se a cansaço visual. Sabemos, por exemplo, que a radiação UV pode acelerar o desenvolvimento de cataratas, mas não possuímos dados concretos sobre a luz azul, embora após a cirurgia de catarata devam ser implantadas lentes intraoculares com um filtro que a bloqueie. Contudo, pessoas com doenças oculares, como a degenerescência macular, poderão ser mais suscetíveis à sua exposição prolongada», refere, salvaguardando que «há estudos que sugerem que a luz é essencial ao desenvolvimento da visão e que uma exposição desadequada parece aumentar o risco de miopia. Não convém “diabolizá-la”, considerando-a um inimigo da visão».

Os efeitos na pele

«A luz azul, que consegue penetrar profundamente na pele chegando até à camada de gordura, tem a capacidade de reduzir uma bactéria, a Propionibacterium acnes, existente na pele e cuja presença leva ao aparecimento de acne. Essa redução é conseguida porque a luz azul altera a produção de uma substância essencial ao metabolismo da bactéria. Assim, a exposição à luz visível resulta na melhoria nas lesões da acne», refere Joana Dias Coelho, médica dermatologista. «Por outro lado, a exposição à luz azul potencia a pigmentação da pele, principalmente a morena, favorecendo o aparecimento de hiperpigmentações e melasma, e aumenta a produção de radicais livres, que favorecem o envelhecimento da pele», explica.


Proteja os seus olhos da luz azul

«Seria importante reduzir o tempo de exposição a dispositivos eletrónicos, mas, infelizmente, a tendência é a contrária, tanto no contexto pessoal como profissional», refere Luís Gouveia Andrade, médico oftalmologista, à Revista Prevenir. Contudo, há estratégias que podem ajudar.

  1. «Ponha em prática a regra clássica “20-20-20”: após 20 minutos ao computador, olhe 20 segundos para um objeto a 20 pés (cerca de 6 metros).
  2. «Para quem usa óculos progressivos, poderá ser útil ter uns apenas para o computador, porque, desse modo, consegue-se uma área visual mais generosa com menos cansaço.»
  3. «O uso de lágrimas artificiais ajuda a manter a lubrificação ocular e pode reduzir o cansaço visual.»
  4. «Há investigadores que recomendam óculos com filtro para a luz azul e o uso de filtros nos ecrãs a quem passa muitas horas em frente a dispositivos eletrónicos para prevenir o cansaço visual. Contudo, esta estratégia não está cientificamente validada e não se sabe, inclusive, se não pode ser até mais prejudicial que a luz azul.»

Protetor solar: Um escudo antiluz azul – use-o todo o ano

«Atualmente, já existem protetores solares com filtros e pigmentos que nos protegem tanto da radiação UVA e UVB, como da luz azul, recomendados para quem tende a desenvolver melasma e hiperpigmentações. Especialmente quem se insere nestes grupos de risco deve avaliar a sua exposição à luz azul e adequar a utilização de protetor solar – pode até ser necessário repor a sua aplicação mesmo em ambientes fechados, se houver exposição a fontes de luz artificiais», esclarece Joana Dias Coelho, médica dermatologista, à Revista Prevenir.


Estratégias para um sono mais descansado

Miguel Meira e Cruz, especialista em Cronobiologia e Medicina do Sono, indica duas estratégias-chave para diminuir a exposição à luz azul e melhorar a qualidade do sono.

  • Não mexa no telemóvel antes de se deitar «Embora varie consoante o horário de sono e da sua sincronização com o relógio biológico individual, seria importante, que pelo menos cerca de uma hora e meia a duas horas antes de ir dormir, deixasse de lado as tecnologias.»
  • Ative o “modo noturno” no telemóvel. «Vários fabricantes tecnológicos (de tablets, smartphones e computadores) já incluem filtros no espectro do laranja e amarelo, o que permite retirar algum do potencial nefasto da luz azul.»
Última revisão: Setembro 2018

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