A importância da relação médico-doente para a sua saúde

A relação médico-doente é essencial para a saúde do paciente

A competência dos profissionais de saúde também se mede pela capacidade de comunicar consigo. E a inteligência do doente – a sua – pela proatividade que consegue imprimir na relação médico-doente e com a sua saúde.

  • PorNazaré TochaJornalista

Vacinas, fármacos, técnicas de diagnóstico, tecnologias biomédicas, tratamentos revolucionários… Graças a todos estes avanços, depois de a ciência nos ter oferecido um generoso prolongamento da esperança de vida (em Portugal, hoje, em média, 80 anos – mais 13 do que na década de 60), já não nos basta viver mais anos. Queremos vivê-los da melhor forma possível, saudáveis e autónomos. E isso dependerá sobretudo do papel proativo que estivermos dispostos a assumir ao nível da nossa saúde.

Tudo começa na prevenção. Mas face à doença e à necessidade de respostas da medicina, os inquéritos demonstram que pacientes informados e participativos na relação médico-doente são uma variável determinante para o sucesso dos tratamentos. Os estudos constatam também que doentes que consideram ter uma boa comunicação com o seu médico têm maior probabilidade de se sentirem satisfeitos com os cuidados de saúde a que são sujeitos; de partilhar informação relevante e mais completa para um diagnóstico preciso; de seguir os conselhos do médico e de aderir ao tratamento; e, logo, de apresentarem melhores resultados.

A era do paciente inteligente

O assunto é urgente: está a consolidar-se uma nova geração de pacientes – smart patient – que já não delega ao médico a total responsabilidade da manutenção ou melhoria da sua saúde; partilha-a.

Os inquéritos demonstram que pacientes informados e participativos na relação médico-doente são uma variável determinante para o sucesso dos tratamentos

Sabe que a competência do médico é também reflexo da sua própria competência expressa, por exemplo, na forma como é capaz de passar informação essencial para que o profissional de saúde possa fazer um diagnóstico acertado e definir a melhor terapêutica para o seu caso. Ou quando, às indicações que recebe no consultório, associa hábitos de vida saudáveis que ajudam a potenciar o sucesso do plano traçado pelo especialista que o acompanha. Todos podem sair a ganhar. Se assim é, então, o que contribui para que esta “relação médico-doente” possa falhar?

As nossas expetativas

A mediatização dos avanços da medicina e de novas tecnologias, até pela via das séries televisivas (quem nunca assistiu a um episódio de Dr. House?!), ajudou a criar expectativas irrealistas em relação à capacidade de diagnóstico e de tratamento dos profissionais e unidades de saúde. Por outro lado, assistimos à proliferação de fontes de informação sobre saúde, de acesso rápido e muito fácil: apps, blogues, plataformas de doentes, sites de clínicas, de revistas ou de organismos oficiais com milhões de visitas mensais, e as incontornáveis redes sociais.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, doentes que estão envolvidos no seu tratamento e que participam na tomada de decisões respondem mais ao tratamento

Mas se a massificação da informação de um tema tão sensível como a saúde envolve benefícios fantásticos (maior literacia na saúde, maior envolvimento do doente e, calcula-se, a poupança potencial de 30 por cento do tempo dos profissionais de saúde que é gasto a analisar e a aceder a dados), também acarreta riscos: autodiagnóstico, automedicação e hipocondria digital – na busca de informação sobre o que se passa connosco, o receio de podermos ter uma doença grave pode impelir-nos a procurar mais dados de forma obsessiva.

A nossa vulnerabilidade emocional

O facto de estarmos doentes ou a “simples” hipótese de estarmos doentes fomenta a ansiedade, o que debilita a nossa autoconfiança ainda antes de entrarmos no consultório, confirma a American Psychological Association. Esse facto explica, em grande parte, porque motivo nos sentimos intimidados quando falamos com o médico. E isso, revelam os estudos, acontece mesmo que tenhamos formação superior. «Dar o seu ponto de vista pode significar discordar, e os pacientes acabam por recear que isso tenha consequências negativas no futuro.»


Resultado? Acabamos por falar pouco e envolvermo-nos menos na tomada de decisões, o que pode condicionar não só o sucesso dos diagnósticos (80 por cento são feitos com base na história clínica relatada pelo doente) como do próprio tratamento. Segundo a Organização Mundial da Saúde, doentes que estão envolvidos no seu tratamento e que participam na tomada de decisões respondem mais ao tratamento.

A pressa dos médicos…

Mas não é apenas o nosso receio de falar que condiciona o sucesso da comunicação que estabelecemos com o nosso médico e, por essa via, o sucesso do tratamento definido. Também os profissionais de saúde estão condicionados em relação ao tempo de cada consulta. Organismos médicos americanos já relatavam, há alguns anos, o cenário a que assistimos hoje na Europa, em hospitais e clínicas: «O atual ambiente de cuidados de saúde exige o aumento de produtividade e que se perca menos tempo com cada doente, o que pode impedir uma comunicação médico/doente eficaz», pode ler-se num documento da American College of Obstetriticians and Gynecologists.

«A exigência por parte dos hospitais que se veja um certo número de pacientes por dia leva a que muitos médicos cortem no tempo que passam com os seus pacientes e o primeiro aspeto afetado é a comunicação», constatava, no final da década de 90, a American Academy of Family Physicians. O mesmo organismo contava, então, que os estudos demonstravam que, em média, um doente fala apenas 18 segundos durante uma consulta, quando seriam necessários três a quatro minutos de conversa para o médico ter a informação indispensável para fazer o seu trabalho.

… e a sua linguagem impercetível

Se é certo que o uso de frases complexas, compostas por termos ininteligíveis para quem não cursou medicina, pode criar um distanciamento (evitável) entre o doente e o médico, também está provado que o comportamento não-verbal de quem nos trata condiciona a qualidade da comunicação no consultório. Um estudo conduzido por investigadores da Universidade do Kansas verificou, por exemplo, que, em caso de internamento, o simples facto de o médico se sentar ao nosso lado faz com que sintamos que a visita durou mais tempo do que se o médico tivesse ficado em pé, ainda que a consulta tivesse tido a mesma duração.

«O atual ambiente de cuidados de saúde exige o aumento de produtividade e que se perca menos tempo com cada doente»

O contacto visual entre médico e doente terá também o mesmo efeito, conta uma fonte citada pela American Academy of Family Physicians. Segundo outra investigação, da Virginia Commonwealth University, os doentes classificam a comunicação com o seu médico de forma mais positiva quando estes têm iniciativas como convidar o doente a exprimir as suas preocupações ou quando estendem a interação com o paciente para fora do consultório, como o corredor. Sorrir, cumprimentar, chamar a pessoa pelo nome, não olhar para o relógio e até sentar-se são atitudes que colocam o médico e o doente ao mesmo nível, o que relaxa o paciente e favorece maior abertura para a comunicação.

 


Comunicação na relação médico-doente

«Médicos que comunicam melhor e que têm melhores capacidades interpessoais conseguem detetar problemas mais cedo, podem evitar crises clínicas e intervenções dispendiosas e oferecer melhor apoio aos doentes», revela o estudo Doctor Patient Communication: A Review – The Ochsner Journal.

O seu médico comunica bem consigo se…

  • Quando o conhece pela primeira vez, diz o nome e apresenta o cargo e competências.
  • Concede um tempo razoável para a consulta.
  • Assegura-se que o doente compreende e está informado.
  • Mostra apreço ao doente pela sua colaboração.
  • A comunicação é marcada pela empatia e aceitação.
  • Mantém contacto visual.
  • Centra a conversa no paciente.
  • É capaz de criar uma boa relação interpessoal.
  • Facilita a troca de informação.
  • Inclui o paciente na tomada de decisão e apoia a criação de consenso entre médico/doente.
  • Dá ao doente o mesmo “tempo de antena”.
  • Está disponível para comunicar via web/SMS.
Última revisão: Março 2015

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