Na pele de um diabético

Na pele de um diabético

O momento do diagnóstico ou o convívio permanentemente com os desafios impostos pela doença poderá provocar sentimentos como revolta ou negação. Estas são, contudo, etapas do caminho para a aceitação da diabetes.

  • PorCarmen SilvaJornalista

  • ColaboraçãoDra. Ana Lúcia CovinhasPsicóloga clínica na Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP)

A diabetes não afeta apenas a saúde física, mas também a emocional. Havendo, como indica a psicóloga clínica Ana Lúcia Covinhas, «uma relação bidirecional entre as emoções e esta doença, dado que se influenciam mutuamente». Neste sentido, o diagnóstico e o tratamento crónico da diabetes «são capazes de, por um lado, despertar uma grande variedade de emoções. Mas, por outro, as emoções que a pessoa experimenta vão acionar respostas comportamentais e cognitivas que impactam a gestão da doença». Ao longo deste processo, ainda segundo Ana Lúcia Covinhas, «acontecem desregulações e reajustes fisiológicos, nomeadamente hormonais, que influenciam o controlo glicémico». As alterações de humor são comuns na pessoa com diabetes «devido às oscilações da glicose (açúcar) na corrente sanguínea e, consequentemente, no cérebro, levando-a a sentir desconforto, zanga e frustração devido às mudanças difíceis de antecipar e de controlar», salienta a psicóloga.

«As alterações de humor são comuns na pessoa com diabetes devido às oscilações da glicose (açúcar) na corrente sanguínea e, consequentemente, no cérebro»

O caminho para a aceitação

«Atingir uma convivência tranquila, integrada e de relativa adesão à terapêutica sem sofrimento psicológico é um processo que vai desde a negação até à depressão, passando ainda pela revolta». Não existem dados, segundo a psicóloga, «que permitam distinguir se o processo de adaptação varia entre homem e mulher». No entanto, «todas as fluências emocionais são normais na gestão da complexa e exigente terapêutica desta patologia», refere. Cada etapa da adaptação psicológica tem a sua função, «devendo ser vivida atempadamente e durante o tempo útil necessário para que a pessoa possa atingir a aceitação da sua diabetes», conclui.

O papel da negação

A negação «é um mecanismo de defesa para fazer face à angústia da perceção da perda de saúde. Uma espécie de descrença em como se tem a doença», explica Ana Lúcia Covinhas, acrescentando que «tanto protege do sofrimento inicial como, se demorada no tempo, acarreta risco para o tratamento da diabetes», na medida em que a pessoa pode retardar o seu início.

A tristeza que permite fazer o luto

Quando se veem perante uma patologia crónica, algumas pessoas podem atravessar um quadro de depressão caracterizado por «tristeza, falta de energia e desesperança no futuro». Quando passageiros, estes sentimentos permitem «viver plenamente a angústia gerada pelo luto associado à perda de saúde, nomeadamente do anterior estatuto da pessoa “sem doença”, para, de seguida, integrar esta nova condição no seu quotidiano», aponta a psicóloga.

A fadiga da gestão da terapêutica é «tipicamente mais prevalente nas pessoas com diabetes tipo 1 devido à maior monitorização dos resultados e maior autonomia na manipulação da terapêutica», indica Ana Lúcia Covinhas

O risco da revolta

O sentimento de revolta é um «estádio dinâmico e proativo no sentido da aceitação da doença», indica Ana Lúcia Covinhas. Deve-se, contudo, «atentar para os riscos do impacto do stresse na saúde porque pode, em consequência, tornar difícil a obtenção de um bom controlo glicémico», explica a psicóloga.

Burnout, o sofrimento maior

O burnout é um estado associado à diabetes, mas independente do processo psicológico de aceitação que surge devido ao «carácter exigente» da doença. «Pode acarretar sentimentos de frustração por não se conseguir atingir a perfeição desejada, de tristeza e solidão na gestão, culpa por se sentir desmotivado, entre outros sentimentos de desconforto que podem aparecer em momentos em que a pessoa se sente mais assoberbada pela gestão do tratamento ou preocupada com a possibilidade de aparecimento de complicações», refere a psicóloga, da Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (apdp), Ana Lúcia Covinhas.

«A negação é um mecanismo de defesa para fazer face à angústia da perceção da perda de saúde. Uma espécie de descrença em como se tem a doença»

Estratégias para controlar as emoções

Para evitar ou ultrapassar mais facilmente as emoções menos boas associadas a esta doença, siga estas estratégias:

  • Siga um plano nutricional adequado à diabetes, uma vez que os alimentos ricos em hidratos de carbono podem influenciar o humor.
  • Siga o tratamento indicado pelo médico para a doença estar controlada. Se for preciso, arranje estratégias para não se esquecer da hora da medicação (como lembretes no telemóvel).
  • Tente perceber que gatilhos a fazem ficar irritada ou zangada porque isto evita respostas irrefletidas a essas situações.
  • Arranje um hobby ou faça atividade física, como yoga, pois isto pode prevenir que se zangue ou se irrite.
  • Converse com a sua equipa de saúde e peça apoio.
  • Procure refúgio na sua família. Quando interessada e motivada, a família representa uma fonte quase inesgotável de suporte e, por essa razão, deve ser envolvida.

Fonte: Adaptado a partir de informação fornecida pela psicóloga Ana Lúcia Covinhas e do The Diabetes Council


Como os níveis de açúcar afetam o humor

A diabetes pode afetar o humor quando os níveis de glicose (açúcar) não estão controlados. Eis os principais sintomas que podem impactar direta e indiretamente a saúde emocional.

Hiperglicemia
O excesso de glicose no sangue pode provocar:

  • Sensação de cansaço ou falta de energia.
  • Fome constante e difícil de saciar.

Hipoglicemia
Baixos níveis de açúcar no sangue podem levar a…

  • Dificuldade em raciocinar.
  • Confusão mental.
  • Ansiedade e irritabilidade.

Fonte: Adaptado a partir de informação presente no site da Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP)

Última revisão: Junho 2020

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